Velho demais


O sol acabara de aparecer por cima da montanha mais alta, e como um observador curioso e nada cauteloso que espia por uma janela, parecia estar sedento por notícias daquele novo dia quente.
Os homens de Bob Nelson me acompanhavam nessa caminhada curta e apressada até o velho hotel em ruínas, que assim como moribundo, teimava em finalmente se dar por vencido. As tábuas podres daquele lugar já tiveram seus momentos de glória, quando em tempos de guerra, os ilustres homens de alta patente celebraram aqui a vitória de suas batalhas, em festas regadas com whisky e luxúria, mas agora, apenas rangiam, parecendo lamentar a tristeza e abandono do lugar. Entramos pela porta lateral, ou melhor, pelo vão onde anteriormente existia uma pesada porta, que agora jazia sob nossos pés, servindo apenas de esconderijo para um rato imundo.
Johnny “nove-dedos”, mais impulsivo, se dirigiu até a parede de pedra, no centro grande salão, onde provavelmente ficavam anteriormente o fogão e a lareira, começando a procurar pela bolsa de couro, com as moedas de ouro mexicano, que ouvimos do próprio Bob Nelson, estarem enterradas em meio aquelas cinzas e pedras. Enquanto isso, o outro infeliz que nos acompanhava, estava suando horrores, um pouco devido ao calor do sol impiedoso daquele dia, mas em grande parte a janta da noite anterior, que não havia lhe caído muito bem, fazendo-o dormir muito pouco, e passar mal logo pela manhã. Mas foi convencido por Johnny a vir conosco na busca, com a garantia de que, com uma caminhada e um pouco de “aventura” teria a sua saúde restaurada. Mas a essa altura, já deve ter descoberto que Johnny, sem dúvida nenhuma, não sabe nada de medicina e muito menos de bem estar.  
Eu me dirigi até uma pequena passagem na parede oposta, na verdade era o espaço onde antes deveriam existir umas duas ou três tábuas, mas agora dava lugar a apenas uma abertura por onde era possível ver a estrutura de um  celeiro, não pensei duas vezes em aproveitar a oportunidade para ir até lá fora e urinar. É claro que poderia ter feito lá dentro, mas cada vez que eu urinava, uma dor, as vezes forte, e as vezes apenas incômoda, arrancavam de mim mais lágrimas que urina, e eu não poderia arriscar passar por essa vergonha na frente daqueles dois, e me tornar alvo das piadas do acampamento inteiro.
Enquanto tentava em vão urinar sob a sombra de uma velha viga de madeira, cerrando os olhos para tentar, ao menos, amenizar a dor que estava sentindo, algo saiu de trás dos escombros de madeira podre do celeiro, foi rápido demais para mim, e eu não consegui alcançar meu coldre, que estava apenas a menos e um palmo de minha mão, à tempo. Por um breve instante a dor que eu sentia deu lugar ao pavor e medo, tal qual eu não sentia desde que era um garoto e fui surpreendido por meu avô, ao espiar minhas primas mais velhas tomando banho no riacho do rancho onde nossa família vivia. 
Para minha sorte e alivio, era apenas o um lobo, jovem o suficiente para não apresentar perigo, e que por fim, pareceu estar tão surpreso quanto eu, afinal ficou paralisado por alguns instantes, tempo mais que suficiente para eu alcançar minha arma e aponta-la, mas não tempo o bastante para atirar, pois sumiu sem deixar pista.
Desisti de urinar, e fechei as calças. É melhor voltar para dentro do velho hotel antes de outra surpresa.

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